Diogo Souza

Escritor e jornalista



O passado é terra que não se pode pisar
É poeira que se desprendeu dos pés
E não nos pertence mais

É a poeira que às vezes o vento traz de volta
Perturba e incomoda
Arde nos olhos, derrama lágrimas
Irrita e suja o presente

Mas aí se sacode, se limpa,
Sopra e passa um paninho
E deixa o vento levar

Passado é só o presente que já usamos
E não nos pertence mais
Limpemos a poeira
E nos livremos no passado



04 de maio de 2016, às 21:45
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“A poesia natural que o rodeia, ao se refletir na imaginação, não se transforma em poema. Ele é, somente, um objeto no quadro, uma pincelada; um acidente na penumbra.”
(O Homem Medíocre – José Ingenieros)


A lua parecia sorrir no céu, mas ele não percebia. O vento soprava e soava por entre os montes compondo uma música lenta e melancólica, mas ele não ouvia. As águas livres da pequena cachoeira diante de si declamavam poesias heroicas e ardentemente apaixonadas, mas ele não as entendia.
Ele não estava distraído, apenas não podia ir além do que seus olhos podiam ver e os ouvidos escutar. Ele estava congelado como um grande iceberg à deriva no oceano gelado. Sua frieza veio com os anos, com os nãos, com as desilusões, a falta de fé em si mesmo e o amor próprio nunca cultivado naquelas terras.
Seu olhar seguia fixo, olhando tudo e não enxergando nada. Ele era quase como uma daquelas rochas inanimadas onde costumava se sentar nos fins de tarde. Tinha toda a poesia do mundo diante de si, mas não a captava, não se apoderava dela.

O reflexo de seu corpo imóvel sentado ali dançava na água do riacho ao ritmo da melodia do vento e da poesia da cachoeira, mas ele não percebia. Não era capaz. Ele estava cego, surdo e mudo. 

(Diogo Souza, em 21 de julho de 2015)